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domingo, 26 de dezembro de 2010

S E R

SOU AQUILO QUE PODERIA SER,
SOU AQUILO QUE ESTÁ SENDO,
 MAS O DEIXARÁ DE SER.
SOU TALVEZ, 
AQUILO QUE JÁ O FUI NO PASSADO,
E CONTINUO SENDO.
SOU AQUILO QUE PROCURO SER,
MAS NEM SEMPRE CONSIGO SÊ-LO.
SOU AQUILO QUE TENHO QUE SER,
MAS A VONTADE É DE NÃO SER.
SOU AQUILO QUE DIZEM SER,
 MAS PREFIRO SER QUEM EU SOU.
SOU AQUILO QUE PRECISO SER,
SOU AQUILO QUE TEM TUDO PARA SER,
MAS NÃO SOU TUDO O QUE TENHO.
ENFIM...
SOU NADA ALÉM DE MIM MESMO.

sábado, 18 de dezembro de 2010

MÁS - CARAS

A música deixa-se ouvir. As conversas fundem-se, as bocas murmurejantes. O baile marcado outrora, chegara. 
Ostentava ela, uma vida  que já não lhe pertencia: vinhos, uísques importados, dispostos sobre a velha prateleira envidraçada, dos tempos de bonança. 
Ao canto, recostado em frente a disforme, e desbotada, parede, seu criado-mudo, que ouvia, sem nada dizer, suas maquinações...As contas do armazém, da boutique, da relojoaria , enlaçam-se com suas fragrâncias francesas, suas pérolas.
A penteadeira lá estava, com um puxador quebrado e o espelho leve e sutilmente trincado. Essa senhora, de meia idade, era conhecida nos círculos aristocráticos, mas não fazia jus a esta condecoração.
Iria ela ao baile, faltava um quarto de hora. Abre seu roupeiro, seu vestido de cambraia já não lhe servia, e , se assim não fosse, já estava desgastado pelo tempo.
Sua esperança, numa divagação, vinha do quintal ao lado. Não fora ela ensinada a perder, a ser derrotada. Já eram 6h55.
Na hora aprazada, entra no baile, radiante, pomposa. Age e fala com leveza, como se nada houvesse acontecido; bebe, dança.
Uma senhora - maldita senhora que revela segredos ínfimos dos seres - reconhece sua roupa, sua atitude clandestina, assim, chama-lhe o soldado. Este a conduz para fora, para a polícia..."rua!". 
Tenta esconder o rosto, dissimular, mas suas máscaras caem, uma a uma, até que desnudada dos "pseudos-eus" que criara, torna-se só, marginal.

Somos todos personagens de um teatro, usando máscaras que nos escondem a essência
(Nietzsche)

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Não permita


Não permita, amor, que eu chore,
Não permita, amor, que eu morra,
Mesmo que a isto, eu lhe implore;      
Para que, onde estiver, me socorra.

Ah! Amor, não me faça mais sofrer,
Só te quero no meu canto,
Que me cesses o pranto,

Já que por ti estou a sorver
A dor do desencanto.

Não permita, amor, que eu viva
Uma vida sem sabor,
Uma vida sem valor,
Uma vida sem você.

V.R.B.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

A moça na janela


Já são quatro horas, próximo ao porto da capital. No alto da colina o sino da velha igreja retine- grande sino- sino púmbleo, talhado, moldado por mãos humanas, que, pela beleza, parecem divinas; os detalhes, as formas e gira... retine, badala;
O sol voraz já começa a fundir-se com as cândidas e risonhas nuvens. As aves já voltam, gorjeando, para seus ninhos, construídos arduamente no alto das frondosas mangueiras. Seus cantos harmoniosos são ouvidos pelos enamorados, que, a espreita, nos altos e belos casarões de taipa, ficam a esperar o outro que vem, que passa.
No casarão 82 vê-se, logo em frente a seus pórticos, um imenso jardim. Ao centro, a relicária fonte, continua sendo o chamariz, jorrando a águas cristalinas, que vão para o alto agressivas e voltam calmas, tênues, mansas.
Lá está ela sentindo a brisa vespertina penetrar-lhe os longos cabelos louros e o frescor que emana da fonte tocar-lhe o pueril e delicado rosto. Da janela azul do casarão 82, a moça contorna a estreita e pedregosa rua, buscando com seus olhos negros e inocentes, aquele que, outrora, tolheu-lhe o sossego e a calma.
O coração palpita desconcertado, o bem-amado pode ser visto descendo a ladeira, usando o terno do primeiro encontro. O terno de linho, branco, bem engomado; trazendo uma gravata, levemente dispostas sobre o peito e na cabeça, sobre os fios castanhos, seu chapéu de camurça.
A moça se apressa, corre, vislumbra. Entra em seu quarto, no final do corredor espelhado, coloca seu vestido azul, que celeste ou não, traz consigo rendas francesas e botões prateados.
Toma em suas macias e pequeninas mãos o frasquinho de perfume, ligeiramente passando-o no rosado pescoço, próximo a gargantilha, que em outros tempos pertencera à avó.
Não, não se pode esquecer: ela derrama o mesmo perfume adocicado, sobre um lenço, por vezes, inútil no fundo da gaveta.
Regressando velozmente, ouve-se o estardalhar dos seus sapatos no assoalho, lustrado e encerado a pouco. Ele a espera, sorridente; ela do segundo andar, à beira da janela de duas partes, acena-lhe com o lenço, que parece voar, batendo asas como as andorinhas que agora dormem.
O lenço transfigura-se em pomba, que voa, cintila e chega-lhe às ásperas mãos. Ele o beija ternamente, tal qual, sorve-se de néctar o beija-flor, sentindo o perfume doce da Rosa amada.
A lua baça corre paro céu, já estrelado. A tranqüila noite iniciara. As luzes, uma a uma, das ruas, dos casebres, dos casarões, das lâmpada e lamparinas começam a embalar num gracioso sono.
“É hora de ir...”- fecha-se a janela. O moço que se despedira de sua musa provençal, mergulha a pensar naquele pequeno lenço, dantes perfumado e amado. E desce a pedregosa rua, onde as rústicas pedras já não o atrapalham: as aspirações, os anseios, os desejos reprimidos, fazem-no transcender a sua própria existência.

domingo, 5 de dezembro de 2010

CHUVA

Já se pode sentir que ela vem. Com força, avassaladora, titubeante.
No horizonte despontam os algodões, que de brancos alvejados, tornaram-se enegrecidos.
Ela vem paradoxalmente: traz a violência do veraneio e o refrigério para as criaturas.
Tudo que ela toca, toca-o sutilmente, ou não, vorazmente. Seu cheiro é inconfundível. Sua tez é intocável, traz consigo os lânguidos trovões. Rumores, vozes indescritíveis, uma movimentação estranha. A simbiose natural muda com sua passagem, ela dá uma nova dinâmica para a vida monótona.
A vida ganha cor, ou dor, ou seja lá o que for, tudo muda, muda mesmo.
A revoada, impedida de continuar, assenta-se nos galhos da amoreira... E ela, impetuosa, intempestiva continua seu ofício.
 A sinfonia melodiosa começa: ela chega. O pássaro canta, os pinheiros balançam, o vento transpassa a fresta da velha janela, assobia, grita.

Lá está o amante a lhe contemplar: sobre o velho canapé, encostado num canto do casebre, ela o toca. O toca de maneira diferente, o beija. Sente o molhado de seu beijo. “Ah como queria estar contigo”... num devaneio pensa na amada. 
O amante está ali, inerte, longínquo, embevecido com aquela transmutação trazida por ela.
Reminiscências rompem-se sobre si e para si. Ela o transporta para um tempo de outrora, tempos imemoriais. Em que juntos – amante e amada - contemplavam sua chegada e a sua despedida. Viam-na, pois, ceder espaço, vez e voz para os raios dourados. Estes eram o motivo da separação. Ele por aqui, ela acolá. Mas a partida, embora anseios contrários, era peremptória.
 De súbito, parece que ela quer ir, ele não a quer deixar... Hipnotizado, quer sorver a sua vivacidade.
A sinfonia aos poucos vai silenciando, ela vai, segue as direções do vento, deixa marcas na terra, na relva, mas vai... a lembrança fica, as sensações também.
Suas marcas são incontestes. “ah! chuva dos enamorados” transmuta a realidade, mas as idealizações de outrora ficam, se perpetuam, ganham cor, dor ou dissabor.
Chuva onírica, cede lugar ao sol, mas não cede a graça do esquecimento aos amantes, que num passado, não tão distante, amaram e eram amados, e hoje amam mas não colhem os frutos da reciprocidade.