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domingo, 5 de dezembro de 2010

CHUVA

Já se pode sentir que ela vem. Com força, avassaladora, titubeante.
No horizonte despontam os algodões, que de brancos alvejados, tornaram-se enegrecidos.
Ela vem paradoxalmente: traz a violência do veraneio e o refrigério para as criaturas.
Tudo que ela toca, toca-o sutilmente, ou não, vorazmente. Seu cheiro é inconfundível. Sua tez é intocável, traz consigo os lânguidos trovões. Rumores, vozes indescritíveis, uma movimentação estranha. A simbiose natural muda com sua passagem, ela dá uma nova dinâmica para a vida monótona.
A vida ganha cor, ou dor, ou seja lá o que for, tudo muda, muda mesmo.
A revoada, impedida de continuar, assenta-se nos galhos da amoreira... E ela, impetuosa, intempestiva continua seu ofício.
 A sinfonia melodiosa começa: ela chega. O pássaro canta, os pinheiros balançam, o vento transpassa a fresta da velha janela, assobia, grita.

Lá está o amante a lhe contemplar: sobre o velho canapé, encostado num canto do casebre, ela o toca. O toca de maneira diferente, o beija. Sente o molhado de seu beijo. “Ah como queria estar contigo”... num devaneio pensa na amada. 
O amante está ali, inerte, longínquo, embevecido com aquela transmutação trazida por ela.
Reminiscências rompem-se sobre si e para si. Ela o transporta para um tempo de outrora, tempos imemoriais. Em que juntos – amante e amada - contemplavam sua chegada e a sua despedida. Viam-na, pois, ceder espaço, vez e voz para os raios dourados. Estes eram o motivo da separação. Ele por aqui, ela acolá. Mas a partida, embora anseios contrários, era peremptória.
 De súbito, parece que ela quer ir, ele não a quer deixar... Hipnotizado, quer sorver a sua vivacidade.
A sinfonia aos poucos vai silenciando, ela vai, segue as direções do vento, deixa marcas na terra, na relva, mas vai... a lembrança fica, as sensações também.
Suas marcas são incontestes. “ah! chuva dos enamorados” transmuta a realidade, mas as idealizações de outrora ficam, se perpetuam, ganham cor, dor ou dissabor.
Chuva onírica, cede lugar ao sol, mas não cede a graça do esquecimento aos amantes, que num passado, não tão distante, amaram e eram amados, e hoje amam mas não colhem os frutos da reciprocidade.

4 comentários:

  1. Huuum ... Muito lindo!!! Perfeitoo!!! :)
    A chuva é como cada momento que vivemos, ela vem, e logo passa, mais deixa em cada um lembranças, deixa sua eterna marca ... hehe Melhor para por aqui nem sei escrever assim tão bem como você ... rsrs
    Ficou maravilhoso!!!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Sabia que um dia você ia se render às possibilidades literárias da rede =D

    E fico muito feliz por ver que você o fez em grande estilo. Este texto lembra não só cheiro de chuva e gosto de solidão, mas também que até o sofrimento vale a pena.

    Parabéns =)

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  4. Nossa, fiquei até com inveja agoraaa
    kkkkkkkkk
    fico mto bonitoo

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